Tecnologia é inútil para nossa sobrevivência

domingo, 2 de setembro de 2012 Postado por Lindiberg de Oliveira


É impressionante como conseguimos estabelecer conexões com absolutamente tudo ao nosso redor – e estou convencido de que este é a principal característica que nos diferencia dos animais. A tecnologia tem se mostrado um grande conector de relações, talvez o maior de todos eles – algo que eu tenho me relutado bastante para aceitar. A conexão é algo essencial para nós, o problema é que estamos montando uma relação patológica com o conector, ou seja, a tecnologia. Suas manifestações são várias, e necessidades – das mais banais as mais importantes – são criadas diariamente.  A verdade é que boa parte do que entendemos por tecnologia é inútil para nossa sobrevivência. Ela sempre foi, e continuará sendo, apenas um instrumento para alcançar nossos objetivos. Não o objetivo em si.
Em 2011 um grupo de empresários e profissionais de ponta aceitou passar uma semana desprovido de seus gadgets – celulares, notebooks, tablets, etc., – em um lugar remoto do estado americano de Utah. Os pesquisadores perceberam que estamos criando uma relação patológica com os aparelhos que nos cercam, não tão grave, mas semelhante às pessoas dependentes de álcool ou drogas. Estamos criando em nosso subconsciente a ideia de que nossos relacionamentos – amizades, contatos de trabalho, romances – dependem deles. A maioria das pessoas está começando a acreditar que não conseguimos mais viver sem eles. Há de muito tolo esse juízo, levando em conta que para nossa sobrevivência, a tecnologia é inútil e, em alguns casos, até mesmo prejudicial.
A internet, talvez hoje, seja o melhor conector de pessoas que conhecemos. E não é difícil chegar à conclusão de que a maiorias das relações feitas pela rede são superficiais, rasos e alicerçados na banalidade. Pessoas que preferem passar horas em frente de seus computadores navegando em redes sociais, postando frases para centenas de “amigos”, a sair com essas pessoas literalmente, prova que o uso abusivo da tecnologia está mudando negativamente nossos relacionamentos. E por esse motivo percebemos que a tecnologia nos isola, nos recolhe da companhia do outro.
Esse tipo de assunto parece meio clichê, mas, a verdade é que essa é a preocupação de muita gente séria. Passamos tanto tempo conectados numa constante expectativa de recebermos um simples texto como “oi”, “como você está?”, “bom dia”. Nosso apego por esses luxos a cada dia que passa está ficando maior e as frustrações decorrentes desse hábito estão começando a aparecer.
Ainda na década de 1970, Jacques Ellul, teólogo e filósofo francês (†1994), já demonstrava os efeitos catastróficos do uso desordenado da tecnologia, corroborando que nenhum tecnólogo é livre, e que há um conflito entre liberdade e tecnologia. Ellul dizia que aos poucos estamos sendo escravizados pela tecnologia; “estamos rodeados por objetos que são atrativos, que são eficazes, etc. Mas que não fazem sentido”.
Não acredito que é esse futuro que desejamos. Temos que encontrar uma solução inteligente para dosar nossas conectividades, e o modo de como usamos a tecnologia. Ora, quando desligamos nossos computadores e celulares, automaticamente começamos a nos sentir isolados, e isso não é porque estamos angustiados de fato. A tecnologia nos escraviza em certo sentido – e aqui não quero tirar o mérito dos benefícios que ela traz –, e nesse caso temos que correr para o lado oposto.
A força da tecnologia é selvagem e rebelde, e se tornou algo profanamente sagrado. O relacionamento com as pessoas era uma finalidade, mas hoje, essa distinção não é mais feita. É relutantemente inevitável que o melhor exemplo deixado para conexões saudável se encontra com o Rabi de Nazaré, que se conectava com todos, mas nenhum conector era mais importante do que a conexão, o que importava mesmo pra ele era as pessoas.
Jesus que tinha a própria natureza como ferramenta de seu trabalho e jamais se deixou deter por algo que não fosse simples e singelo. Compartilhava tudo com todos, tendo como conector as coisas mais imprevisíveis: o pão, o peixe, as lágrimas o vinho, a praia, o suor, o barco, um poço, uma tumba, a vida, a morte, os sorrisos, e até mesmo a Cruz. Sim a Cruz. Jesus não se relacionou com ela, mas através dela, o Filho do Homem se reconectou de vez com o mundo, e com cada partícula que nele se encontra. Ele nos deu exemplo do que é uma verdadeira rede social, na praia com seus discípulos; no monte, em meio a um sermão; no deserto, alimentando uma multidão; na beira de um poço, na companhia de gente de baixa moral; na última ceia, cantando, comendo e bebendo, celebrando o que de fato é comunhão.
©2012 Lindiberg de Oliveira