A teologia de Tolkien

domingo, 25 de dezembro de 2011 Postado por Lindiberg de Oliveira

“Quem abre uma cova nela cairá;
Se alguém rola uma pedra,
Esta rolará de volta sobre ele”.
Salomão, em Provérbios.


J. R. R. Tolkien, ao escrever a trilogia O Senhor dos Anéis, inseriu ali a história da humanidade e implantou a maior de todas as verdades: as lutas, tentações e ambições das criaturas boas ao rejeitar o poder e das criaturas más ao aspira-lo. É absolutamente inegável que uma das principais linhas perpendiculares dessa epopeia é politico.

Tolkien rejeitava a obsessão contemporânea em relação à tecnologia, que mecanizava a alma humana, e sempre desconfiava dos valores políticos, se posicionando a favor de nenhum dos partidos da sua Inglaterra. Nem o comunismo – que em sua época já era conhecido como a personificação do próprio mal, implodindo décadas depois –, e nem a democracia – que foi elevada como ápice da evolução politica e moral –, pareciam vir com propostas lúcidas para a humanidade. Certa vez disse a respeito:

Não sou democrata – apenas porque a “humildade” e a igualdade são princípios espirituais corrompidos pela tentativa de se mecanizá-los e formalizá-los, e como resultado o que temos não é singeleza e humildade universais, mas universais grandeza e orgulho, até que algum Orc resolva se apossar de um Anel do Poder e sejamos então, como estamos sendo, escravizados.

Tolkien desvalia, por mais bem intencionado que fosse, qualquer tipo de controle inconstitucional. Sobre isso ele confessou privadamente numa carta a seu filho Christopher:

Minhas opiniões políticas tendem cada vez mais para a anarquia (compreendida filosoficamente, significando abolição de controle, e não homens barbudos armados de bombas) – ou talvez a uma monarquia aconstitucional. Eu gostaria de poder prender qualquer pessoa que usasse a palavra “Estado” (em qualquer sentido que não para referir-se ao domínio inanimado do solo da Inglaterra e seus habitantes, algo que não tem nem poder, nem direitos nem mente); depois de uma chance de retratação, eu os executaria sumariamente se permanecessem na sua obsessão.

Tolkien trazia em seu coração um novo mundo, onde as pessoas saboreava com a alma os valores e a simplicidade da vida. Sua suspeita ao progresso e aversão pela vida mecanizada, foram inseridos sutilmente em O Senhor dos Anéis. A Terra Média é abitada por seres – como os hobbits e os elfos que quanto mais vivem uma vida simples, mais próximos da perfeição permanecem. São seres que vivem em harmonia com a natureza, sem agredi-la. Vivem na terra, e dela tiram o seu sustento e tudo em quanto, sem que o seu cenário natural seja correspondentemente alterado.

E isso não é tudo, como observou certa vez João do Pó, o que mais diferencia O Senhor dos Anéis de outras odisseias é como os seus heróis lutam para salvar o mundo. Tolkien, ao querer produzir sua própria mitologia, moldou sua história a partir dos grandes épicos e clássicos que tanto admirava, mas com uma diferença. Todas as histórias antigas narram seus heróis em busca de algum artefato poderoso para salvar o mundo. Tolkien resolve ir à contra mão disso tudo. Em O Senhor dos Anéis, para que o mundo seja salvo, os mocinhos tem a missão de destruir um objeto poderoso, e não encontra-lo.

O poder emanado do objeto (o anel) a ser destruído corrompe aquele que o possui, e todos durante a trama são tentados a possuí-lo. Tolkien nos apresenta um desfecho suficientemente peculiar; em um último momento, nosso herói cede às tentações e deseja pra si o poder do anel, levando a um impasse iminente em que um dos vilões arranca o artefato juntamente com o dedo de Frodo, caindo assim, dentro de um vulcão em chamas, indo com ele a glória de salvar o mundo. No final das contas nosso herói não salva o mundo, mostrando assim que todos são corruptíveis diante do poder, e, no entanto, é mostrado que o próprio mal é responsável pela sua destruição.

Tolkien deixa claro em sua obra que o mal é sempre inferior ao bem, admitindo assim algumas verdades dita por seu amigo C. S. Lewis, o qual afirmava que o mal é sempre inferior ao bem, pois, para o mal ser mal, antes de tudo tem que ser um bem corrompido. O anel, sendo apenas anel não passará de um artefato, mas, tendo concebido um hospedeiro toma personificação, o poder toma forma e sempre tenta dar um mergulho ao irremediável absolutismo.

Enfim, Tolkien pinta um retrato convincente do Bem, da Beleza e da Verdade. Deus é visto nas entrelinhas e Sua glória é refletida de forma magistral. Essa é a teologia de Tolkien, esse é o seu legado.

©2011 Lindiberg de Oliveira


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